04/01/2012 20h32 - Atualizado em 04/01/2012 20h32
Padre italiano expulso na ditadura quer voltar a atuar em Pernambuco
Padre Vito Miracapillo chegou ao Recife na última terça-feira (3).
Autorização para revalidar o visto permanente saiu em novembro de 2010.
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Padre Vito Miracapillo diz que não guarda mágoas.
(Foto: Katherine Coutinho / G1)
A justiça foi feita. Foi essa a sensação que o padre Vito Miracapillo teve quando soube que poderia revalidar seu visto permanente no Brasil. O padre, que vem todos os anos a Pernambuco, chegou na noite desta terça-feira (3), sendo recebido com festa pelos amigos de Ribeirão, cidade da Mata Sul de Pernambuco onde foi pároco, antes de ser expulso do Brasil em outubro de 1980.(Foto: Katherine Coutinho / G1)
Os advogados do padre no Brasil conseguiram a revalidação do visto em novembro deste ano. "Eu não queria simplesmente um novo visto. Tinha que se reconhecer que era uma ação da ditadura militar, que somente o regime e umas poucas pessoas que o apoiavam é que queriam me expulsar”, afirmou Miracapillo em conversa com a imprensa na tarde desta quarta-feira (4). “Como houve a revogação da expulsão, não caberia um novo visto, mas sim a renovação, que foi pelo que lutamos”, explicou o advogado do padre, o ex-deputado Pedro Eurico.
Na próxima semana, Miracapillo deve se apresentar às autoridades competentes com os documentos para dar continuidade à revalidação do visto. “Eu estou em casa no Brasil, me sinto em casa. Durante os anos que fiquei sem poder vir, recebi centenas de brasileiros em minha casa na Itália, que me traziam notícias”, lembra o padre, que espera poder voltar a trabalhar no país.
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Pároco atual da cidade de Canosa, próxima à sua cidade natal, Andria, no sul da Itália, Miracapillo tem um amor especial pelo Brasil e pelo povo da região da Mata Sul de Pernambuco. “Eu já disse várias vezes que amo o povo brasileiro, mas a minha vinda para esse país foi uma escolha de vida. Eu estava na escola de teologia em Verona, na Itália, que prepara os padres para a América Latina quando escolhi estudar o Brasil e decidi que era aqui que eu queria executar a minha missão”, conta.A decisão do local de sua missão não mudou nem com a expulsão na década de 1980, sob acusação de se recusar a celebrar uma missa pelo dia da Independência. “Quando eu entrei no avião para ir embora, me perguntava quando poderia e se poderia voltar. Foi um grande sofrimento para mim e para o povo de Ribeirão. Foi como sentir a morte”, relembra.
Voltar a trabalhar no Brasil depende da aprovação do bispo ao qual é submetido da Itália, fato que ainda precisa ser melhor conversado, segundo o padre. “Minha vontade é voltar e retomar os trabalhos pastorais que tinha aqui, mas nenhum bispo quer perder seus padres”, diz, bem humorado, acrescentando que a comunidade em que atua na Itália também não quer sua partida.
No dia 13 de janeiro, o padre deve ir a Palmares, para a comemoração das bodas de ouro da fundação da diocese. "O bispo Dom Genival me convidou e vou estar lá com outros padres para comemorar esses 50 anos da diocese", conta. A festa para chegar à cidade deve ser a mesma de sempre. "Fico ainda mais feliz de ir já com o visto permanente, mas é sempre a alegria de chegar em casa. Ribeirão é a minha casa", se declara.
Mágoas
“Eu chorei quando fui embora, mas desde aquela época eu perdoei todos aqueles envolvidos na minha expulsão. Eu disse ao capitão que me interrogou que não tinha nada contra ele. Meu problema era com a ditadura, o sistema, não as pessoas. Não guardo raiva, nem mágoa no coração”, explica Miracapillo.
O padre foi acusado também de ser subversivo, uma vez que lutava por condições de vidas melhores por seus paroquianos e defendia um grupo de camponeses em busca da confirmação da posse das terras que ocupavam. “Um padre não pode fechar os olhos para as necessidades e problemas de seus paroquianos. Aquelas pessoas mereciam condições dignas de vida”, afirma.
Comissão da Verdade
Apesar de não guardar mágoas, o padre ressalta que as pessoas têm direito a saber o que aconteceu durante a ditadura militar no Brasil. “A sociedade tem direito a saber o que foi feito da vida de seu povo. Quem julga mesmo está lá em cima, é Deus, e todos vamos ter que nos entender com ele. Mas a sociedade também tem direito de julgar os crimes que foram cometidos”, acredita.
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